Toda a comoção em torno da morte do Papa Francisco — e a atenção mundial que antecede o Conclave e a escolha do novo Papa — só mostra a força do catolicismo mesmo dois mil anos depois que Jesus Cristo escolheu Pedro para “edificar sua Igreja” e “apascentar suas ovelhas”.
Cada novo Papa que assume ajuda a escrever a continuação de um dos livros mais emocionantes da Bíblia: os Atos dos Apóstolos. Escrito por São Lucas, narra a história da expansão do cristianismo após a ascensão de Jesus, descreve o nascimento da Igreja, o envio do Espírito Santo no Pentecostes e a atuação corajosa dos apóstolos, principalmente São Pedro — o primeiro Papa — e São Paulo — o convertido. É um exemplo de como fé, escrituras bíblicas e relatos históricos se entrelaçaram até chegar aos dias de hoje.
Como Atos, entendem-se as primeiras pregações, os primeiros testemunhos de quem conviveu com Cristo, as conversões, os milagres, as perseguições e as viagens missionárias. Mesmo quem não é religioso pode ler essas escrituras como a histórica de coragem de quem ousou enfrentar poderes estabelecidos e chamar de “irmão” mesmo aqueles que não faziam parte de sua família (naquele tempo, isso era praticamente um ato subversivo, como bem observado pelo escritor francês Emmanuel Carrère em sua magnífica obra O Reino).
O livro dos Atos dos Apóstolos é um registro fundamental sobre como o evangelho se espalhou de Jerusalém até os confins do Império Romano, formando as primeiras comunidades cristãs. Era uma época em que certezas começavam a ruir, civilizações colapsavam ao colidirem com outros povos, tempo de mudanças profundas na economia, na configuração da sociedade e nas visões de futuro. Foi nesse caldeirão que o cristianismo prosperou, porque a palavra e o exemplo de Jesus Cristo avam uma mensagem de amor, de acolhimento ao próximo e, mais do que tudo, de esperança.
É incrível que um credo permaneça tão forte, popular e respeitado depois de tanto tempo. Outras crenças milenares simplesmente desapareceram, como o culto aos deuses gregos. Outras religiões se transformaram menos numa busca espiritual e mais numa guerra interminável contra todos os outros credos. Mas o cristianismo — e o catolicismo, que parece estar crescendo no mundo como há muito tempo não se via — pode ser explicado com a parábola do grão de mostarda: “O Reino de Deus é como um grão de mostarda, que um homem semeou na terra. Embora seja a menor de todas as sementes, quando cresce, torna-se a maior de todas as hortaliças e desenvolve grandes ramos, de modo que as aves do céu podem fazer ninhos à sua sombra.”
É curioso que justamente Pedro tenha sido escolhido por Jesus para assumir a tarefa de ajudar a desenvolver esses grandes ramos e ninhos, numa imagem de acolhimento bastante propícia a uma humanidade que sempre se sentiu desamparada. Pedro era impulsivo, intempestivo; negou Jesus três vezes, se arrependeu, pediu perdão. Era, enfim, humano como cada um de nós, e humano como será o próximo Papa, mais um apóstolo de Cristo.