
Após a aprovação do Decreto-Lei 36 pelo Senado italiano nesta quinta-feira (15), o clima é de indignação e tristeza entre pessoas e entidades que militam nas questões que envolvem os descendentes no Brasil. A medida é vista como algo que vai muito além do aspecto burocrático, e na verdade significa um forte abalo na relação cultural e emocional existentes entre a Itália e os descendentes de imigrantes.
Esta é a sensação da presidente do Comites-RS (Comitato degli italiani all’Estero - Comitê dos italianos no Exterior-RS), a caxiense Cristina Mioranzza. Ela se declara muito triste com a situação, especialmente por esta ter vindo justo quando o RS lembra os 150 anos da imigração. Mesmo assim, ela defende a comemoração da data, pois acredita que a postura dos políticos italianos ressalta ainda mais o acerto da decisão das pessoas que optaram por sair da Itália e buscar uma vida melhor.
– Nós temos que comemorar e valorizar muito, justamente por serem pessoas que largaram a Itália, que assim como fez no ado, hoje novamente vira as costas para os cidadãos do exterior. Eu hoje olho para a Itália com tristeza, mas valorizo ainda mais os nossos anteados que vieram para cá. É uma sensação de pertencimento tão grande ao RS que eu jamais imaginei pensar – desabafa Cristina.
O sentimento de decepção também é forte para o sociólogo e genealogista Daniel Taddone, membro do CGIE (Consiglio Generale degli Italiani all’Estero - Conselho Geral dos Italianos no Exterior). Ele estava no Senado italiano, acompanhou a votação e entende que a própria postura dos senadores mostrou desprezo e leviandade com a matéria. O presidente da mesa abriu os trabalhos e logo após saiu, não tendo comandado a sessão, e apenas 119 dos 205 parlamentares estavam presentes para votar.
Taddone aposta que a questão inevitavelmente vai parar nos tribunais e, olhando por esse aspecto, até consegue ver alguns pontos positivos no projeto aprovado.
– O ponto positivo é que o texto é tão agressivamente ruim, que é mais fácil para derrubar ele depois, na Corte Constitucional. Eles foram bem grosseiros, pois o texto é mal redigido e complicado, fora as inconstitucionalidades como retroatividade e o uso do decreto-lei para regular uma matéria como essa – defende o conselheiro.
O texto ainda ará pela Câmara dos Deputados, mas o debate nesta casa deve ser rápido, pois o governo da primeira-ministra Giorgia Meloni deve acionar o voto di fiducia. Este instrumento presente no regime parlamentarista italiano obriga a base do governo, que é maioria, a votar em bloco o projeto, apenas escolhendo sim ou não, sem espaço para emendas ou debates. O deputado Fabio Porta, um dos três representantes da América do Sul no parlamento do país europeu, acredita que o uso deste dispositivo deve ser confirmado nos próximos dias.
Ele também se mostrou desapontado com a aprovação, que considera um desrespeito aos italianos do exterior, por ferir a dignidade dessa comunidade. Porta considera a proposta um “um tiro no pé”, pois vem em um momento de recessão demográfica na Itália, e mesmo itindo que a oposição é minoria, promete trabalhar contra o projeto na Câmara:
– De qualquer maneira, como eleito para representar a América do Sul, vou participar do debate na comissão e no plenário, declarando extrema contrariedade e tentando até o último segundo derrubar este decreto ou tentando modificá-lo de forma radical.
Por 81 votos a 37, o plenário do Senado da Itália aprovou nesta quinta-feira (15) o Decreto 36/2025, criado pelo governo da primeira-ministra Giorgia Meloni. A proposta altera os critérios para concessão da cidadania italiana, e limita este direito a apenas filhos e netos de italianos já reconhecidos.