
De Caxias do Sul até a Coreia do Sul, a viagem pode levar mais de 24 horas. Partindo daqui de avião é preciso ir até São Paulo, ar por uma conexão com algum país europeu ou do Oriente Médio, até chegar a Coreia, destino que tem despertado o fanatismo de jovens e adultos a começar pela idolatria aos artistas do k-pop, ando por diversos outros aspectos da cultura, como o cinema, os programas de televisão e a culinária.
K-pop, abreviação de korean pop, vem se consolidando como um dos ritmos que mais conquista fãs no Brasil. Para se ter uma ideia do tamanho do fenômeno, o grupo Stray Kidz, que se apresentou no Brasil em março, reuniu 175 mil fãs em três shows, lotando estádios como o Morumbis, em São Paulo e, o Engenhão, no Rio de Janeiro.
Para driblar a distância e aquecer ainda mais o sentimento de amor e iração pela cultura coreana, caxienses com idades entre 11 e 60 fundaram, em 2023, um grupo chamado Armygas, que remete ao nome dado aos fãs do grupo BTS, os Army.
Fazem parte cerca de 150 membros que se encontram para curtir festas temáticas, sessões de cinema, piqueniques e jantares com pratos típicos. Uma das organizadoras é a Priscila Hulf Bertolucci, 35 anos.
— É bem eclético e as idades são bem variadas. Temos um Army Boy também. A gente fala muito do BTS, dos projetos deles, da saída do exército, já que eles vão sair em junho (leia mais abaixo), mas a gente também fala de coisas do dia a dia, afinal, é um grupo de amigas — brinca.

Serviço militar? Como assim?
- O BTS é quase unanimidade entre os fãs de k-pop. Contudo, mesmo sendo pop-stars, os membros do grupo BTS também precisam cumprir o serviço militar na Coreia do Sul.
- Por lá, o serviço militar é uma obrigação para todos os homens entre 18 e 28 anos, com duração de 18 a 21 meses. Por isso, o grupo está em pausa desde o final de 2023.
- Os membros V, RM, Jimin e Jungkook se alistaram em dezembro de 2023 e devem ser dispensados em junho deste ano, enquanto que Jin e J-Hope já cumpriram o serviço e foram dispensados da obrigação.
"As letras dão ânimo, falam muito em não desistir"
Além do BTS, grupos como EXO, TWICE, Seventeen, Stray Kidz e BLACKPINK conquistam cada dia mais fãs ao redor do mundo. Para Priscila, o sucesso deles pode ser atribuído não só ao ritmo contagiante, mas também às mensagens das músicas.
— Para mim, o K-pop surgiu em um dia 31 de dezembro, virada de ano. Eu estava pra baixo, olhando vídeo no YouTube, e surgiu o vídeo dos meninos, se não me engano Boy of Luv. Fui me aprofundando, na época, eu estava desempregada, então tinha muito tempo livre. Fui consumindo tudo e conhecendo um pouquinho de cada um. Por um bom tempo eu só escutava BTS, depois fui conhecendo outros grupos. Eu já fui em shows do Stray Kidz, conheço outros grupos como Big Bang, EXO, Red Velvet, Aespa... — relembra.
Para Priscila e para a legião de fãs que o BTS conquistou ao redor do mundo, o sucesso pode ser atribuído às mensagens das músicas. Além do ritmo dançante e contagiante, as letras tratam de amor próprio, sentimentos positivos e superação.
— Eles falam sobre amar e cuidar de si mesmo. Sem julgamento, de ser quem você é, do jeito que você é. Se amar em primeiro lugar, não dar bola para a opinião dos outros, de quando diminuem, falam alguma coisa sobre teu corpo, tua cor, orientação sexual. Eles ajudam muito as pessoas que estão para baixo. As letras dão ânimo, falam muito em não desistir, saúde mental e injustiça social. O Army, em geral, está envolvido em alguma questão social — orgulha-se.

"O BTS conseguiu me tirar da depressão"
A caxiense Rúbia Machado, 36 anos, diz que ser fã do BTS a ajudou a sair da depressão. É assim que ela própria define o impacto do k-pop na sua vida. Foi em 2019 que uma nova história ou a ser escrita. Por indicação de sua psicóloga, Rúbia resolveu mergulhar na cultura musical coreana como uma forma de resgatar seus sentimentos de infância.
— Era aquela situação: uma menina negra, de periferia, que nunca pôde realizar nada. A psicóloga falava que me faltava essa parte de realizar sonhos, de ser fã. Ela falou que eu tinha que procurar alguma coisa, algum artista que me encantasse. Eu achei a maior viagem e pensei: “Pelo amor de Deus, olha a minha idade, mãe de dois filhos. Como é que isso vai acontecer?” — relembra.
Foi quando assistiu por acaso a um vídeo do músico J-Hope, do BTS, na internet. Rúbia se encantou e se impressionou pelo amor dos fãs, o que despertou nela a curiosidade de saber quem era esse artista. A partir daí, começou a pesquisar mais sobre o ritmo e virou fã.
— O BTS me tirou da depressão. Faltava essa coisa de me conectar como fã. Foi bem bonito. O meu marido até brinca que se encontrar eles vai agradecer — brinca.
A expectativa agora é pelo retorno do BTS pós-serviço militar obrigatório. Rúbia conta que já tem um cofrinho onde guarda dinheiro para realizar o sonho de assistir um show do grupo quando vier ao Brasil. Não importa onde for.
— Já tenho até a caixinha roxa. Porque o símbolo deles é o roxo. Esse dinheiro que a gente guarda pra viagem, hospedagem e ar horas e horas na fila. A gente entra numa rotina, quando é adulto e tem que esquecer de brincar, de cantar... A sociedade faz a gente perder, faz a gente amadurecer de forma bruta. Nas músicas, eles falam muito disso. Então, não podemos perder a nossa essência.
Além da expectativa do retorno da banda, a caxiense espera ansiosa pelo lançamento do show da turnê Hope on the Stage, de J-Hope, que será exibido nos cinemas de todo o Brasil no dia 31 de maio (Cinépolis e GNC, em Caxias do Sul). O espetáculo de encerramento, que ocorre no estádio Kyocera Dome Osaka, no Japão, será transmitido ao vivo na telona.
— Eu estou alimentando a minha criança. Algo que me foi negado pelas condições e pela maneira que eu vivia na época. E eu sempre falei pro universo, eu vou ganhar bem, eu vou trabalhar bem, eu vou realizar tudo o que eu quero, que também é o que as músicas deles falam — orgulha-se.

Espaço de acolhimento
Integrante do grupo Armygas desde 2024, Bárbara Bernardi, 31 anos, orgulha-se de ser fã dos grupos de k-pop, principalmente do BTS. Convivendo com outros fãs no grupo Armygas, diz ter encontrado mais pessoas da sua idade que também são fãs do grupo.
— As pessoas, às vezes, acham meio estranho, ainda mais porque eu não sou uma pessoa tão nova pra gostar disso, mas é uma paixão que a gente tem no fundo do coraçãozinho. Por isso a gente não se sente só, e estamos sempre buscando coisas novas — relata.
Bárbara conheceu o grupo quando foi assistir, no cinema, a transmissão do show do integrante do BTS, Kim Nam-joon, RM: Right People, Wrong Place.
— Eu não sabia que tinha mais meninas que também eram fãs. Então, me senti bem acolhida por elas. Normalmente, a gente não tem pessoas próximas que entendam do assunto. Mas ali, no grupo, a gente fala abertamente de tudo, das roupas, da discografia.