Desculpa, Papai Noel, mas escrevo para Elvis Presley – a quem peço uma demonstração de coragem.
O Elvis a quem está endereçada esta carta é o novo prefeito de Farroupilha, Fabiano Feltrin. E o motivo desta carta é o sítio do antigo Moinho Covolan, que resiste bravamente como lugar de cultura e convivência urbana no coração da cidade que você, Fabiano Elvis Feltrin, vai governar a partir de 1º de janeiro de 2021.
O velho Moinho, Elvis, está ameaçado, como nunca aconteceu antes. Até um leilão está marcado, em fevereiro, para o carnaval das fortunas locais.
Em resumo, o objetivo desta carta é pedir que você, Elvis, ao receber as chaves da cidade, articule forças, ideias e projetos para impedir que o Moinho desapareça do horizonte da terra considerada “Berço da imigração italiana no Rio Grande do Sul”.
Isso nada mais é do que um dos seus papéis constitucionais, como prefeito: zelar pela história e pela cultura da sua aldeia; agir pelo bem coletivo da sua gente.
Além da Constituição, há um agravante simbólico que lhe dá ainda mais responsabilidade nesse caso: o fato de você encarnar Elvis na sua vida. Você veste as roupas do rei, canta as suas músicas, imita sua arte, seus gestos. Invoca, portanto, o Seu espírito.
Não queira esquivar-se no gabinete, dizer que o prefeito é apenas o empresário Fabiano. Você vestiu a fantasia, misturou palco e realidade. Bebeu da fonte de Elvis Presley, por sua conta e risco. Fez Dele seu mito-protetor. E um padrinho galáctico, que certamente ajudou a lhe projetar e agora também a lhe eleger.
Perguntas legítimas, pois, já estão nos ares: será com o prefeito Elvis Feltrin que o Moinho será jogado às feras – ou ao chão? Será agora, com Elvis no palco do poder, que os palcos do Moinho, seu café e seus espaços de memória, seu museu, suas tribos diversas, justo agora tudo será silenciado, esquecido?
A história do Moinho é longa, o imbróglio jurídico é duro. Mas também as roupas originais do Elvis, que você veste, são justas. Quem quer os louros da fama paroquial tem de encarar a plateia, lidar com suas lutas intestinas.
O velho (e contemporâneo) Moinho, Elvis, que já ressurgiu das ruínas uma vez, pode ser mais possibilidade do que problema, mais futuro do que ado. As novas gerações lhe cobrarão isso.
Elvis, eu fui responsável por você se apresentar, certa vez, no magnífico palco do Theatro São Pedro, na capital. É para este Elvis que eu escrevo esta primeira carta, em crônica. Vamos ver do que é feito este Elvis. Hora do show!