
Em junho do ano ado, em Brasília, o ministro da Educação, Camilo Santana, anunciava 10 novas universidades federais nas diferentes regiões do Brasil. Entre elas, um sonho antigo da comunidade da Serra: a instalação de um campus em Caxias do Sul. A proposta foi por uma extensão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com um prazo anunciado pelo governo federal na época para o início das atividades neste segundo semestre. Um ano após o anúncio, seguem os estudos para a implantação da unidade no município, mas em um cenário diferente: as restrições orçamentárias impostas às instituições federais impactaram no cronograma do processo.
Conforme a comissão da UFRGS responsável pelo projeto da instalação na Serra, ainda não há um prazo para a conclusão dele. Após finalizado, ele precisa ainda ar pela aprovação do Conselho da universidade federal para depois seguir com os trâmites no Ministério da Educação (MEC).
A reitora da UFRGS, Márcia Barbosa, relata que após as restrições no início do ano e depois, em abril, a universidade focou-se na recuperação orçamentária. Isso impactou na entrega desse projeto e na apresentação ao conselho universitário, bem como pode, consequentemente, impactar na projeção feita no início do ano de que as atividades poderiam começar em março de 2026:
— Vamos ter que fazer todo um trabalho, recomeçar o trabalho com a comunidade, para a comunidade entender que vai ter recursos. Ao mesmo tempo que estamos trabalhando com o governo federal para garantir que o recurso de custeio também seja garantido. Porque até agora o que eles prometem são 60 milhões (de reais) para abrir o campus. Mas, depois, tem dinheiro todo ano. E estamos negociando para que esse dinheiro venha e que as vagas (de docentes e servidores) venham, porque não votaram ainda no Congresso as vagas. Então, toda essa demora, a demora no orçamento, em não definir o custeio, em ter a garantia das vagas de docentes técnicos istrativos, está atrasando o processo.
No ano ado, quando o anúncio das 10 novas universidades foi feito, o governo federal prometeu o investimento de R$ 60 milhões para cada unidade por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No material divulgado na época também havia a promessa de uma garantia de pelo menos seis cursos e a contratação de 388 servidores em até cinco anos.
Já nas últimas semanas, cortes nos orçamentos das universidades federais brasileiras entraram em pauta. Aprovada em março pelo Congresso Nacional, a Lei Orçamentária Anual (LOA) 2025 trouxe uma redução de R$ 340 milhões do valor que seria reado pelo governo às instituições de ensino. A situação fez com que, no fim de maio, o ministro Camilo Santana anunciasse uma recomposição de R$ 400 milhões aos cofres das instituições federais de ensino.
A reportagem questionou a assessoria de imprensa do Ministério da Educação (MEC) sobre a garantia para o custeio do campus em Caxias. Em nota, a pasta afirma apenas que há o recurso previsto para instalação, a partir do Novo PAC, e que a partir do início das atividades, os novos campi "am a integrar a matriz orçamentária para receber recursos de custeio":
"O recurso previsto para instalação dos dez campi está previsto no Novo PAC, totalizando R$ 600 milhões, sendo R$ 60 milhões para cada campus (R$ 50 milhões para construção/aquisição de imóvel e R$ 10 milhões para aquisição de equipamentos). A partir do início das atividades, os novos campi am a integrar a matriz orçamentária para receber recursos de custeio (funcionamento)".
Projeto precisa ar por conselho universitário
A professora Maria Beatriz Lucce, que coordena a comissão, atualiza que avanços no projeto de instalação foram feitos a partir de pesquisas durante os últimos meses e também visitas à Serra. O projeto deve indicar quais os cursos devem ser contemplados e como deve ser o funcionamento do campus. O grupo se reúne semanalmente para elaboração dele, além de manter comunicação constante e seguir com as visitas na região. Uma das conclusões divulgadas é de que foi verificada a necessidade de mais vagas públicas para o ensino superior na Serra.
A comissão foi oficializada em março deste ano, sendo que vinha realizando os primeiros trabalhos desde novembro de 2024. Na época do anúncio do campus, em junho, a universidade da capital estava em processo de troca de reitoria, o que impactou no início do levantamento. Márcia Barbosa assumiu em setembro.
A comissão analisa dados como a oferta da educação superior na região, condições de funcionamento para os estudantes — como o transporte, dados do ensino básico, a matriz de desenvolvimento regional da Serra, entre outros. Há também conversas com lideranças, entidades e a comunidade.
— Nessa comissão estabelecemos logo, como de hábito na universidade, um plano de diretrizes. Para resumir, obviamente é construir condições de planejamento para uma inovadora unidade universitária pública, honrando a universidade democrática com excelência acadêmica de vanguarda científico-tecnológica, comprometida com a sustentabilidade social, econômica, política, politico-democrática e ambiental. Esses são os mandatos, digamos, os grandes princípios do planejamento das universidades públicas e da UFRGS, em particular. E amos a fazer estudos de planejamento participativo, conversando com pessoas de várias áreas do conhecimento da UFRGS.

Pela legislação, o projeto precisa ser aprovado e apresentado pelo conselho universitário. A aprovação é necessária até mesmo para a compra do Campus 8 da Universidade de Caxias do Sul (UCS), que é, atualmente, a principal possibilidade de ser sede da UFRGS na Serra. A coordenadora destaca que "todo mundo está convencido" sobre a relevância social do campus. Contudo, o projeto também deve trazer informações que comprovem a viabilidade econômica da unidade:
— Precisamos receber algumas informações que estão sendo providenciadas para mostrar ao conselho universitário e que ele possa tomar a decisão com conhecimento de causa, sobre a viabilidade, com o número de cargos de professores e de técnicos e recursos para a infraestrutura. O elemento que mais nos preocupa é o custeio a partir do início desta implantação.
Áreas que podem ser contempladas
Anteriormente, em visita à Serra, o vice-reitor da UFRGS Pedro Costa adiantou que as áreas de saúde, ciências agrárias, ciências sociais aplicadas, licenciaturas, engenharias de computação e humanidades podem estar entre os seis cursos já previstos para o campus. Maria Beatriz, que coordenou antes a criação da Universidade Federal do Pampa, afirma que como os estudos seguem, mais áreas podem aparecer. A coordenadora observa que a escolha dos cursos deve levar cuidados como, por exemplo, não criar uma sobreposição de ofertas de vagas que já existam em outras instituições da região.
— Sabemos quais são áreas potenciais para o desenvolvimento econômico e social da região. Sabemos quais são os cursos que já existem. Então, não vamos abrir outro. A decisão é um amadurecimento também, da tranquilidade de tomar uma decisão ponderada, estudada. O nosso conselho é muito cuidadoso. Tenho a convicção de que a região de Caxias tem um ritmo de desenvolvimento, de conscientização, inclusive de educação básica, que leva a uma demanda por uma universidade federal. O processo está sendo cuidadoso porque queremos corresponder a esta confiança que o governo federal teve ao propor que a UFRGS seja a universidade que vai fazer essa implantação e que possamos fazer um projeto de campus que seja do tamanho da Serra — declara a coordenadora.
Maria Beatriz acredita também que, junto com a graduação, devem ser ofertados cursos de mestrado, doutorado, projetos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico para atender a região.
Articulações na região para receber campus
Uma das articuladoras políticas do projeto na Serra, a deputada federal Denise Pessoa (PT) relembra que Caxias foi a única cidade do Sul contemplada com o campus da universidade federal, o que foi uma grande conquista para região. Denise recorda das articulações nesses primeiros meses de projeto para receber a instituição:
— A reitora falava muito da necessidade da garantia do transporte (para os estudantes). Articulamos junto à Amesne (Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste) esse compromisso dos municípios de garantir o transporte, de garantir que tenha ibilidade para os estudantes. Então, temos dado essa retaguarda, claro, deixando a autonomia da universidade de fazer o seu trabalho, da UFRGS decidir os cursos e pensar nesse projeto pedagógico. E também acompanhando toda a questão da estrutura e de investimento que será necessário para a compra, no nosso caso, tudo se encaminhando para a compra do Campus 8, como sede da universidade.
Denise reconhece a preocupação da universidade com o custeio do campus e afirma que também seguirá em articulações com o MEC:
— Sabemos que as universidades federais têm essa preocupação e nós também vamos estar junto com o MEC, buscando essas garantias para que dê segurança para as decisões da universidade. Mas, é importante dizer que a decisão foi do presidente Lula. Portanto, entendo que sendo uma decisão de governo, essas condições serão colocadas.
Relembre o caso
- Em 10 de junho de 2024, 10 novas universidades federais são anunciadas pelo Ministério da Educação. Entre elas, uma instituição destinada a Caxias do Sul.
- Em setembro, a Universidade de Caxias do Sul (UCS) confirma negociação para Campus 8 ser a sede da UFRGS na Serra.
- Em novembro, uma comissão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) inicia os estudos para o projeto de instalação.
- Uma Comissão de Assessoramento para criação e instalação do Campus Serra da UFRGS é oficializada em março deste ano. Primeiro prazo para entrega do projeto era no primeiro semestre.
- Durante o primeiro semestre deste ano, universidades federais aram por cortes orçamentários, o que impactou na conclusão e na apresentação do documento.