Ônibus já era ruim antes. Agora, piorou. Bom mesmo era quando tinha aquela outra empresa. Como era mesmo o nome? Ah, mas isso faz trocentos anos, eu era solteira naquela época. Época boa, não tinha todo esse trânsito. Tu te lembra quando se pagava com ficha? Lembro da azul e da lilás. Depois teve amarela e laranja. Uma delas era para estudantes. Eles ainda pagam meia? Bah, uma vez tinha que comprar no Prataviera, no antigo Triches ou na Bento. Onde na Bento? Na esquina com a Visconde. Agora dá pra comprar pelo WhatsApp. Mas tu já tentou carregar o cartão e pagar pelo aplicativo do Banrisul? Não funciona. Por isso prefiro ir lá na central e pagar em dinheiro. Meu marido brigou com o funcionário do estacionamento rotativo porque o parquímetro não funcionava. Paga no aplicativo, ele disse. Mas eu não tenho aplicativo, respondeu. Agora todo mundo é obrigado a ter para conseguir estacionar, um absurdo. É que hoje em dia tem que ter aplicativo para tudo. Daqui a pouco vai ter até para respirar. Haja memória no celular! O meu é antigo, só uso para falar com os filhos que moram fora. Eu não baixei o aplicativo do banco, tenho medo de sequestro-relâmpago. Tô indo lá na prefeitura pegar o boleto do IPTU. Onde já se viu não mandarem mais em casa! Eu não vou pagar pela internet. Vai que é golpe. Eu não tenho internet em casa. Nem sei qual é o site da prefeitura. Prefiro pagar na lotérica, é mais garantido. Ninguém vai poder dizer que não paguei, tem o comprovante em papel. E essa muleta? Rompi os ligamentos. Era tu que jogava futebol com o pessoal da Antena? Não, era com os guris do Jardel. Mas isso faz anos. Tô subindo o morro agora para dar um alô pra eles. Tu viu se já ou o Colina? Sim, acabou de sair. Não acredito que perdi! Mas que idiota! Tava olhando o celular e me distraí. Filha, chama um Uber, mas cuida a tarifa dinâmica. O quê? Trinta reais? Tá louco, não vou pagar tudo isso. Sim, eu era louco quando era criança. Louco de pedra. Era pancada. Eu tocava o terror em casa, na escola. Era louco mesmo, ia até ser internado. Agora não sou mais. Fulana me falou que eu era louco. Mas não sou, tô falando sério. Já fui, não sou mais. Louco é o cara que pegou a guria de 13 anos. Foi lá em São Marcos. É, em São Marcos. Tá preso o abusador. Já era. Vai sair no Pioneiro. E tu viu o outro que quebrou a pau a namorada? Ele com 18 e ela com 17. Já era, ela é menor. Vai tá no Pioneiro, é só comprar.
Nota: esses são diálogos que ouvi nos últimos tempos nos ônibus e paradas de Caxias do Sul.