
A alcunha de Cidade Mais Italiana no Brasil pode parecer pretensiosa, mas se justifica logo no primeiro eio pelo centro histórico de Antônio Prado. O município de 13 mil habitantes preserva o maior acervo da imigração italiana no Brasil, com seu conjunto arquitetônico e urbanístico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O tombamento foi realizado há 35 anos recém completados.
São 48 casas, construídas entre as décadas de 1890 e 1940, que formam a coleção que sintetiza o conhecimento dos imigrantes italianos e de seus descendentes sobre técnicas de construção e que também mostram como a casa, para o imigrante italiano, era uma extensão da sua fé e do seu trabalho.
– Essas casas foram erguidas com estrutura de madeira, principalmente araucária, com a utilização de técnicas construtivas que combinam saberes tradicionais trazidos da Itália com as possibilidades oferecidas pelo novo contexto. A construção com paredes de tábuas, o uso de pregos industrializados, e a presença de lambrequins, caixilharias trabalhadas, sótãos e beirais salientes caracterizam um estilo próprio, ao mesmo tempo funcional e expressivo. O acabamento, por sua vez, revela a importância da casa como símbolo de estabilidade, pertencimento e continuidade cultural – explica a arquiteta e urbanista Patrícia Pasini, especialista em restauro de patrimônio histórico.

Os casarões tombados podem ser identificados por uma pequena placa de metal, contendo informações históricas sobre o imóvel. Uma destas casas, de 1914, que já serviu de sede para a agência de correios e telégrafos, atualmente abriga o comércio de licores artesanais Nono Deomar, além de uma pequena pousada para viajantes a trabalho ou famílias que visitam o município especialmente durante sua festa mais popular, a Noite Italiana.
O proprietário, Carlos Rotta, 59, cujo pai adquiriu a propriedade nos anos 1950, conta que, à época do tombamento, a família tinha a venda do imóvel encaminhada para dar lugar a um prédio, algo que seria impedido pelas normas do Iphan.
Embora tenha perdido o negócio, hoje diz estar satisfeito por poder contar aos visitantes a história dos seus anteados, beneficiando-se do incremento do turismo em Antônio Prado:
– A maioria das casas tombadas já não tem mais uma ligação com os moradores antigos ou com as famílias que as construíram. Por isso, quando alguém vem visitar com esse interesse em conhecer a história, os detalhes, ou mesmo ter recordações da sua infância, é bacana poder receber e oferecer este serviço além de servir um licor ou uma graspa para enriquecer a experiência.

Além de ter sido fundamental para que Antônio Prado explorasse sua italianidade como produto turístico, o tombamento favorece a construção da memória coletiva das famílias pradenses, bem como a compreensão desse legado dentro de um contexto histórico e social.
– Ao contrário da preservação de imóveis isolados, que muitas vezes perdem sua leitura espacial e urbana, um conjunto preservado permite compreender a paisagem cultural em sua complexidade, através da escala das construções, dos materiais predominantes, dos sistemas construtivos tradicionais, da implantação dos lotes e da relação dos mesmos com o espaço público. Em Antônio Prado, esse conjunto expressa com clareza os modos de vida da imigração italiana, suas estratégias de adaptação e sua organização social e produtiva enquanto comunidade. São patrimônios vivos que guardam o ado, estruturam o presente e oferecem possibilidades futuras de pertencimento e uso social – destaca Patrícia Pasini.
Se não bastasse toda a história que carrega por si só, o centro de Antônio Prado também serviu de locação para diversas cenas do filme O Quatrilho, dirigido por Fábio Barreto, e concorrente ao Oscar de melhor filme internacional em 1996. O longa é uma adaptação do livro homônimo de um dos mais célebres escritores e pesquisadores serranos, José Clemente Pozenato, que faleceu em novembro do ano ado.