
Tombado pelo Patrimônio Histórico e Arquitetônico de Caxias do Sul desde 1986, o prédio que abriga a Escola Estadual de Ensino Fundamental Presidente Vargas, no centro de Caxias é, por si só, uma referência aos primórdios da cidade. Mas além das colunas e amplas janelas observadas por quem a no cruzamento das ruas Visconde de Pelotas e Bento Gonçalves, o imóvel preserva uma série de características históricas nem sempre em destaque ou literalmente escondidas. É o caso da pintura original das salas de aula descoberta por acaso há cerca de dois anos e que a direção agora pretende restaurar e destacar em meio às cores atuais das paredes.
Professora de história e atual diretora do Presidente Vargas, Viviane Mandelli Canali ouvia da mãe, Maria Tereza Mandelli Canali, perguntas a respeito da pintura das salas de aula. Ambas foram alunas da instituição, mas a professora nunca tinha entendido exatamente ao que a mãe se referia. Tudo fez sentido durante uma aula de Viviane e foi um estudante o responsável por revelar o que estava escondido há décadas sob várias camadas de tinta.
— Minha mãe perguntava se a escola ainda era bordada. Eu estava dando aula em substituição a outra professora, um aluno bateu na parede e caiu o reboco. Eu fui ver o dano que tinha causado, se ele tinha se machucado, enfim. Eu vi que ele não me deu um dano na parede, me deu um presente do redescobrimento da história da nossa escola. Aí eu fui entender o que minha mãe queria dizer. Nunca tinha pensado em escola com esse tipo de pintura — afirma Viviane.
Na última quinta-feira (2) um pedaço de tinta se desprendeu em outra sala, durante a limpeza da parede, e revelou um novo segmento da pintura histórica. As cores são diferentes daquela revelada há dois anos. Em ambos os casos, a pintura apresenta formas desenhadas sobre um fundo de cor uniforme, em um padrão que atualmente seria mais comum obter com a aplicação de papéis de parede.
A ideia de preservar o revestimento da década de 1930 surgiu ainda quando o reboco da primeira parede se desprendeu. Foi somente neste ano, contudo, que Viviane se tornou diretora titular do Presidente Vargas, o que permitiu que ela se dedicasse à busca de parcerias.
A primeira medida foi procurar a orientação do Museu Municipal, que fica ao lado da escola. A equipe da instituição reou o contato de restauradores, que já foram contatados por Viviane para desenvolver um projeto. A intenção é ao menos proteger as paredes com uma placa de acrílico ou material semelhante e identificar a pintura. A melhor solução, contudo, ainda vai ser avaliada pelo restaurador.
— Na educação, é importante saber de onde se veio para saber para onde se vai. Se eu conseguir restaurar essa pintura, para mim é um sonho. Queremos recuperar o carinho dos estudantes pela escola e esse restauro é ponta de lança de todo o resto — revela Viviane, que já recuperou e expôs antigos equipamentos e troféus da instituição.

A possibilidade de restaurar as paredes internas abriu caminho para um projeto mais amplo, de recuperação da fachada da escola, que atualmente apresenta as marcas do tempo. As janelas de madeira, por exemplo, são de 1936 e estão deterioradas. Além disso, a diretora pretende substituir as grades por um cercamento de vidro, para reintegrar o prédio ao entorno. O entendimento, é de que o Presidente Vargas pode integrar um eixo histórico do Centro, já que é vizinho ao Museu Municipal.
— O que me impulsionou a ir mais rápido foi um dia que estava parada na frente da escola e ou uma senhora e disse "não queria que dessem vaga para um filho meu nessa escola, ela está caindo". Se nas nossas escolas não nos preocuparmos com a história delas, o que esperar do resto? — questiona a diretora.
Prédio é de 1936
O prédio que abriga a escola Presidente Vargas é mais antigo que a própria instituição, inaugurada em 19 de abril de 1960. A edificação foi erguida em 1936 para abrigar o Colégio Elementar José Bonifácio de Andrade e Silva, criado em 1912 em um imóvel na Rua Os Dezoito do Forte. O terreno escolhido já fez parte do complexo da prefeitura de Caxias, quando ela funcionava no atual Museu Municipal. Na época da mudança de endereço, o Colégio Elementar foi anexado à Escola Complementar de Caxias, que funcionava em dois prédios da Rua Pinheiro Machado.
Quase 30 anos mais tarde, em 1960, a instituição, já com o nome de Escola Normal Duque de Caxias, foi transferida para a Avenida Júlio de Castilhos, no bairro Cinquentenário, dando origem ao Instituto Cristóvão de Mendoza. Foi nesse momento que surgiu o Presidente Vargas, criado na data de aniversário do patrono, o ex-presidente Getúlio Vargas.
Desde então, algumas características se mantêm. A fachada mudou de cores, mas preserva as características arquitetônicas originais. As janelas e o piso também não foram modificados, segundo a direção.
Recentemente, a escola concluiu pintura e outras melhorias no corredor do piso inferior e uma licitação está prevista para reformas no forro, no telhado e em assoalhos de madeira. Não há previsão, porém, de recuperação da fachada.
Pinturas também no Museu Municipal
Formas artísticas na pintura interna não são exclusividade da escola Presidente Vargas. Logo ao lado, no prédio do Museu Municipal, duas paredes exibem padrões semelhantes, com figuras desenhadas sobre um fundo de cor única.
Conforme o diretor de Museus e Memória da Secretaria Municipal da Cultura, Itamar Ferretto Comarú, não há registro da autoria e nem do período em que as pinturas foram desenvolvidas, mas elas estão expostas como forma de preservação da história.
— Essas pinturas antigas nos prédios públicos, nos prédios mais clássicos, era uma coisa comum e que acabou se perdendo na ideia de pintar, por exemplo, no caso do Museu Municipal, tudo de branco. Elas podem ter sido feitas em um primeiro momento ou para ornar o espaço mediante algumas das utilizações que ele teve ao longo do tempo — explica.
O imóvel que abriga o Museu Municipal, com linhas no estilo colonial português, foi construído em 1884 para servir de moradia à família Morandi-Otolini. Dez anos depois, o poder público local adquiriu o imóvel que, a partir de então, abrigou fórum, colégio, delegacia de polícia, guarda municipal, intendência (atual prefeitura) e a própria prefeitura. O espaço ou a ser ocupado pelo museu em 1974, quando a sede da istração municipal foi transferida para o atual endereço na Rua Alfredo Chaves, no pavilhão que havia sido construído para a Festa da Uva de 1954.