Se depender do foco de Guilherme Camini Pinto, 17 anos, os livros de mangás, os quadrinhos de heróis e as composições musicais – três de suas paixões – perderão espaço ao longo deste ano para os cadernos de provas antigas do Enem e para as obras literárias lembradas nos vestibulares. O adolescente, estudante do terceiro ano no Colégio Estadual Protásio Alves, morador do bairro Menino Deus, em Porto Alegre, quer conquistar uma vaga no curso de Engenharia Civil, de preferência na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), para ter a possibilidade de estudar à noite e continuar trabalhando no período do dia.
Recém saído de um estágio de dois anos numa agência bancária, Guilherme já tem outro emprego em vista. Até por isso, só finalizará o cronograma de estudos quando receber um retorno sobre a vaga. Como estuda no Protásio pela manhã e pretende continuar trabalhando à tarde, restarão as noites para a preparação especial rumo ao Enem – o que já vem ocorrendo pelo menos uma hora por dia.
A escolha pela Engenharia surgiu há um ano, quando analisou o mercado de trabalho. Mesmo entusiasta da música e do cinema — chegou a pensar em cursar uma das duas áreas —, Guilherme optou pela matemática — outra área irada por ele — e a possibilidade de ter mais chances de um emprego com estabilidade no setor.
Filho dos vendedores autônomos Verediana Camini, 44 anos, e Silamar Pinto, 47, Guilherme conta com o apoio da família e usa o computador do irmão, o estudante de istração Jean Ramone, 25, para fazer simulados via internet. Na escola, considera-se um aluno disciplinado.
Em 2018, o jovem fez as provas por curiosidade. Surpreso com o próprio desempenho, alcançou mais de 700 pontos em matemática. O resultado foi acima do esperado por ele e lhe deu ânimo para tentar neste ano — desta vez, valendo. Guilherme vem produzindo pelo menos duas redações mensais e lido ainda mais sobre as notícias do Brasil e do mundo. A intenção é melhorar as notas em linguagens, ciências humanas e na redação. Outro objetivo é controlar a ansiedade antes e durante as provas.
— Meu problema foi a redação. Por ter crescido nessa época digital, talvez, em que a comunicação tem correção automática, sempre acabo empacando nas redações e em análise sintática — avalia.
Entre a infância e o início da adolescência, a estudante Anna Carolina Schneider Martins, 18 anos, assistiu de perto a luta da avó, Leda Schneider, contra o câncer de mama. Órfã de pai desde os nove anos, ela morava com a mãe, a psicóloga Silvia Schneider, e os avós maternos no bairro Rio Branco, em Porto Alegre. E foi observando como os médicos atendiam a familiar, dando a segurança necessária durante o tratamento, que Anna encantou-se pela medicina. A escolha da profissão, porém, veio depois de a jovem perder a avó para a doença e ainda ver a própria mãe enfrentar o mesmo tipo de câncer. Dentro de um posto de saúde de Porto Alegre, enquanto acompanhava Silvia numa consulta, Anna tomou a decisão.
— Vi como aqueles médicos tratavam com amor e respeito os pacientes do Sistema Único de Saúde e pensei comigo: "Quero fazer o mesmo!". Daquele momento em diante, cada dia é focado em me tornar médica. Quero fazer pelas pessoas o que eles fizeram pela minha família — enfatiza, emocionada, a jovem que comemorou a cura da mãe, no início deste ano, depois de seis anos de tratamento.
Estudante do terceiro ano no Colégio Santa Inês, Anna Carolina, ou Valente — como é conhecida devido aos longos cabelos cacheados e ruivos, parecidos com o da personagem do filme —, é apaixonada pela disciplina de biologia, daquelas que não aceitam tirar menos do que 10 na prova. Aluna da primeira cadeira na primeira fileira, não se importa de estudar até seis horas diárias além do turno na escola.
Com cronograma próprio de estudos, organizado com a ajuda dos professores da escola, ela tem lido as notícias diárias e as obras recomendadas para ampliar o próprio repertório cultural. De tão focada no objetivo, Anna se inscreveu no Enem do ano ado apenas para "perder o medo". Na estreia, alcançou 680 pontos sem estudar para as provas. Agora, a meta é fazer, no mínimo, mais 200, e sem curso preparatório.
— Aprendi com a minha mãe que só através do estudo e do meu esforço eu conseguirei o que eu quero — assegura, confiante, a jovem que quer ser especialista em medicina da família.
Até poucos dias antes desta entrevista, o vendedor Rafael Cabral, 23 anos, de Alvorada, tinha dúvidas sobre a profissão que deseja seguir caso obtenha boas notas no próximo Enem. Estava entre os cursos de Jornalismo e de Letras-Licenciatura. Instigado pela própria reportagem, Rafael colocou na balança as paixões, o próprio histórico profissional e as lições aprendidas nas aulas noturnas do curso pré-vestibular popular Minervino de Oliveira, onde reforça a preparação para o exame e as provas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
— É Letras. Não tenho mais qualquer dúvida. Amo estar em sala de aula e já me vejo sendo professor, ajudando os meus alunos — garante.
Na única vez em que se inscreveu para o Enem, em 2016, não chegou a fazer as provas. A desistência veio por conta de incertezas relacionadas à profissão e da confirmação da chegada do primeiro filho. Casado há cinco anos com a primeira namorada, Andriele Lopes Flores Cabral, 23 anos, Rafael é pai do pequeno Henry, de quase três anos. Evangélico, faz questão de dizer que o casamento e o filho foram planejados pelo casal e, agora, sabe exatamente o o necessário para chegar à profissão escolhida.
Comunicativo, Rafael percebeu nas próprias experiências pessoais que lecionar seria o caminho ideal. Além de crescer vendo a mãe, a educadora aposentada Sonide de Assis, trabalhar em sala de aula, hoje ele é professor na escola bíblica da igreja frequentada pela família.
No início deste ano, apoiado pela mulher, Rafael comprou um notebook usado para recomeçar os estudos. Em seguida, soube da seleção para o curso popular e se inscreveu. Aprovado para as disputadas aulas, agarrou a oportunidade. Com uma rotina que começa às 5h e só termina por volta da meia-noite, ele aproveita cada segundo disponível para estudar. Funcionário de uma loja na Zona Norte de Porto Alegre, o vendedor coloca as leituras em dia nas duas horas diárias dentro do ônibus, na ida e na volta. O intervalo do almoço também é usado para estudar, assim como as manhãs de sábado e domingo em casa.
Confiante, Rafael finaliza a entrevista usando a única frase que sempre lhe vem à cabeça quando pensa na UFRGS:
— É entrar, entrar ou entrar.
Aos 17 anos, Fernanda Casali Soares, hoje com 28, inspirou-se na mãe, a auxiliar de enfermagem Luciana Casali, para escolher a profissão. Na época sem condições financeiras de ingressar e manter-se numa universidade, cursou o Técnico de Enfermagem. Logo depois da formação, começou a trabalhar na área e a prestar concursos. E foram os cursos preparatórios para as seleções que garantiram a Fernanda a experiência de nunca ter se afastado dos estudos nos últimos 11 anos.
O casamento com o técnico de enfermagem Victor Menezes, há 10 anos, o nascimento da filha Luiza, atualmente com seis, e o trabalho como técnica em postos de saúde e hospitais — ela foi aprovada em três concursos municipais — acabaram distanciando Fernanda da universidade.
— Sempre quis fazer uma graduação, mas não era o momento certo. Agora, com a Luiza um pouco maior, chegou a minha vez — afirma.
Desde o início deste ano, a rotina se intensificou com as aulas no curso pré-vestibular Unificado no período da manhã. À tarde, Fernanda atua numa unidade de saúde no bairro Bom Jesus, e só retorna para casa por volta das 20h, no bairro Petrópolis, quando dedica duas horas à família. As horas de estudo costumam ocorrer diariamente, entre 22h e meia-noite, depois de colocar a filha para dormir. Fernanda quer alcançar boas notas que a levem ao curso de Enfermagem, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E, apesar de nunca ter se afastado dos cadernos, ela percebeu uma diferença entre as preparações para concursos e para o Enem e o vestibular.
— Antes, eu tinha a fórmula para decorar o que cairia nas provas. Isso mudou. Preciso, realmente, entender cada assunto e ainda guardar na memória. É mais difícil, mas estimulante — destaca.
Para a técnica de enfermagem, que prestará o Enem pela primeira vez, a maior dificuldade durante as provas será istrar o tempo. Mesmo assim, mantém a confiança de conquistar os pontos suficientes.
— Apesar da desvalorização crescente, tenho muito amor pelo que faço e acredito que a enfermagem é de extrema importância na promoção da saúde de uma comunidade — sintetiza.
— Informar um endereço de e-mail único e válido, e número de telefone fixo ou celular válidos.
— Solicitar, se necessário, atendimento especializado, específico e/ou pelo nome social.
— Indicar o município onde deseja realizar a prova.
— Selecionar a língua estrangeira (inglês ou espanhol) para a prova.
— Criar uma senha de o ao sistema.
Fonte: Inep/Enem