
Em 31 de agosto, comemora-se o Dia do Nutricionista, mas afinal de contas: qual é o papel desse profissional?
Hoje, ao mesmo tempo em que temos a obesidade como uma doença de epidemia mundial, vivemos uma época de terrorismo nutricional. Simplificamos a classificação dos alimentos em "certo e errado", "bom e ruim", e tentamos criar regras únicas de consumo e generalizações infundadas.
Luto diariamente no meu consultório para mudar a ideia das minhas pacientes de que elas têm que ser magras, têm que se privar do que gostam para que isso dê certo, que fazer dieta é difícil e torturante, que só tem que comer comida de verdade o tempo todo, mesmo que isso seja inviável na rotina – o que gera culpa e sentimento de fracasso.

O que acontece é que não pensamos mais no alimento inteiro e na sinergia (ação associada) dos nutrientes que o compõe. Queremos rapidez de preparo, praticidade de consumo e queremos que os alimentos nos tragam os objetivos que buscamos (emagrecer, diminuir celulite), mas esquecemos que a alimentação é algo que transcende essa visão reducionista.
A alimentação está relacionada com nossa memória afetiva: quem não lembra da comida da vó ou da mãe? Ou daquele prato especial que o pai faz(ia)? Quem nunca se reuniu em volta de uma mesa para comemorar alguma conquista, ou para (re)encontrar os amigos?
Hoje em dia, comer é um ato revolucionário. Se você se sente livre para colocar no seu prato o que quiser, sem sentir culpa e de forma equilibrada, você faz parte de um grupo muito pequeno de pessoas que estão fora desse contexto de terrorismo nutricional.

O desequilíbrio vem quando tratamos tudo com extremismo e criamos regras alimentares muito rígidas. Aquela velha máxima "tudo que é bom, não pode" se encaixa muito bem nessa visão distorcida que temos da alimentação. O gostoso não é proibido, mas acabamos perdendo a noção do que é equilíbrio. Tudo, na vida e na alimentação, que for em excesso, não é saudável. O eventual não deve virar habitual.
As mudanças que o profissional nutricionista prop para você alcançar seus objetivos têm que ser algo dentro da sua realidade e sustentável a longo prazo. Caso contrário, seus resultados durarão apenas o tempo que você aguentar viver em restrição, seja ela qual for.
O papel do nutricionista é escutar o paciente, entender suas necessidades, identificar suas dificuldades, adaptar a alimentação às suas demandas, informar sobre os benefícios e malefícios de todas as opções alimentares, guiar e educar o paciente, mas cada um deve ter liberdade e autonomia de escolha.

Depois de toda essa reflexão, deixo aqui quatro dicas. São simples, mas te ajudarão a mudar seu comportamento. Seguindo-as, você ficará mais perto do seu objetivo:
Comece com metas pequenas
Não dê um o maior que o tamanho das suas pernas. Quanto mais distante tiver o alvo, mais difícil será de mirar e acertar. E se não ser certo, maior vai ser a frustração. Comece com objetivos pequenos, palpáveis e que, quando alcançados, te estimulem a continuar. Por exemplo: se você consome refrigerante todos os dias, um objetivo ineficaz é querer, do dia para a noite, parar de tomar. Você não vai resistir muito tempo, e achará que não tem força de vontade o suficiente. Talvez o melhor seja, num primeiro momento, reduzir a quantidade diária ou até tomar dia sim, dia não. E gradativamente, no seu tempo, de forma sutil, você vai se livrando de um hábito que não melhora a sua saúde. Lembre-se: o bom, não é inimigo do ótimo. Pequenas mudanças são sempre bem-vindas.
Não desista quando houver deslizes
Entender que durante o processo haverão deslizes e saber lidar com eles é fundamental. Não se sentir fracassado só porque comeu um chocolate que não estava programado, aceitar que está tudo bem, e voltar à rotina normal. Isso é muito importante. Não jogar tudo para o alto no primeiro escorregão, não se julgue, não se culpe. Não seja tão severo consigo mesmo. Comeu / bebeu algo que não estava planejado? Não conseguiu ir à feira e comprar tudo orgânico? Não conseguiu cozinhar na semana, e terá que apelar para sanduíches em casa? Tudo bem, se organize para que na próxima vez não aconteça, mas deixe isso de lado: tá tudo certo. Bola pra frente, e segue no teu rumo!
Entenda que o processo demora
O cérebro não gosta mudanças: isso faz ele gastar mais energia do que ele gostaria. Por isso, ele tenta sempre te levar a fazer as mesmas coisas de sempre. Tá entendendo porque o processo de mudança é difícil? É lento e demorado mesmo, e a gente precisa aceitar e tomar consciência que com inhos suaves e sutis vai dar certo. As mudanças na nossa vida acontecem de duas formas: na dor ou no amor. Para quê associar algo tão incrível como a alimentação à dor, ao sofrimento? Associe o amor, o positivo, à mudança de hábitos e perceba todas as pequenas mudanças na sua vida.
Mantenha o hábito na maior parte do tempo
Isso é o que eu falo de equilíbrio. Achar o caminho do meio entre o que tu quer e o que tu precisa, entre a tua vontade e a tua necessidade. Ter hábitos que te trazem saúde 80% do nosso tempo, faz com que tenhamos liberdade para consumir outras coisas que, talvez, não tragam tantos nutrientes, mas que nutrem outras partes do nosso ser.
Mas atenção: nesse texto eu falo de pessoas sem nenhuma doença de base, que deliberadamente se restringem e têm uma relação doentia com o alimento. Obviamente, pacientes diabéticos, hipertensos, celíacos, intolerantes, ou portadores de outras inúmeras condições de saúde deverão, com acompanhamento adequado, excluir alguns alimentos em prol da melhora da sua saúde.
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Raquel Lupion é formada em Nutrição e Educação Física, tem especialização em Nutrição Clínica e Mestrado em Ciências do Movimento Humano. Sua motivação é promover um estilo de vida saudável, fugindo de radicalismos e tentando encontrar o caminho do meio entre o que é necessário e o que é prazeroso. Na vida profissional, divide seu tempo entre atender em consultório, dar aulas de yoga, palestrar e ministrar cursos. Escreve semanalmente em revistadonna.com.