Público estranha japonês vivido por Luis Melo em "Sol Nascente"
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A justificativa, desde aquela época, sempre foi a mesma: a de que não existem atores orientais aptos aos papéis. Mas será que, em 2016, no Brasil, país que comporta a maior comunidade japonesa fora do Japão, realmente não existem atores de ascendência oriental para interpretar esses personagens? Depois de termos avançado tanto na discussão da representatividade na mídia, esse tipo de atitude me parece um grande retrocesso frente a todas as conquistas alcançadas até agora em inúmeros setores por diversas minorias. Os japoneses e seus descendentes já estão no Brasil há mais de um século, e vivem na sociedade brasileira como cidadãos de qualquer outra etnia: com famílias multirraciais, amigos e profissões das mais variadas possíveis, incluindo, veja só, a de atores e atrizes (só no coletivo citado são mais de 100). Ainda assim, continuamos sendo rotulados e encaixados dentro dos estereótipos que o olhar dominante criou para nós. Já não nos basta mais ser a irmã mais nova e viúva (que, apesar de ter o mesmo avô americano, é "puramente japonesa") do patriarca interpretado por um caucasiano, o adolescente geek e engraçadinho aficionado em tecnologia e jogos digitais, a artesã especializada em peças e luminárias de bambu, a prima que quer um casamento tradicional japonês e faz questão de se envolver apenas com japoneses ou descendentes. Não precisamos de uma protagonista interpretada por uma atriz caucasiana para contar ao público, na estreia da novela, quem somos e como nos relacionamos a sua personagem enquanto permanecemos calados dentro de um templo budista (religião que não é comum a todos nós, por incrível que possa parecer para alguns). Não precisamos que a mesma atriz dite tendências da moda no país se apropriando culturalmente do kimono, traje tradicional da nossa cultura, hoje utilizado apenas em festividades. Precisamos apenas que nos sejam dadas vozes para falar (sem sotaque) e oportunidades ao menos parecidas com as que os atores ocidentais têm. Só assim conseguiremos deixar de ser vistos como apenas o tintureiro, o feirante, o pasteleiro, o nerd, a melhor aluna da turma. Só assim nossos rostos serão conhecidos o bastante para que não "precisem" mais escalar atores de traços ocidentais para interpretar o patriarca de nossa família.

P.S.: Gostaria de deixar claro que não tenho absolutamente nada contra o Luis Melo e a Giovanna Antonelli. Considero os dois excelentes atores e não questiono, de forma alguma, seu talento e profissionalismo – apenas a inadequação do casting.

*Jéssica é assistente de conteúdo de Zero Hora, estudante de Jornalismo da UFRGS e neta de japoneses

Confira a íntegra do manifesto do coletivo Oriente-se:

Nós, artistas e profissionais das artes com ascendência oriental, seja japonesa, chinesa ou coreana, reivindicamos por igualdade no tratamento justo a todos os cidadãos, repugnando práticas de discriminação étnica que ocorrem em algumas produções de audiovisual que retratam o oriental de forma estereotipada, preconceituosa e distorcida da realidade. Em especial para produções populares de rede aberta como novelas, seriados e comerciais que atingem a maioria da parcela dos cidadãos brasileiros, influenciam diretamente a sociedade promovendo às vezes, o conceito deturpado e negativo, denegrindo a imagem dos orientais e educando as novas gerações com a visão preconceituosa contra a nossa comunidade.

Somos parte integrante da sociedade brasileira, nascemos, vivemos e contribuímos com muito trabalho para o enriquecimento e desenvolvimento de nossa nação. Ter a presença de atores e artistas orientais em produções de audiovisual em papéis não estereotipados e de forma respeitosa, é o mínimo e o justo que a comunidade oriental brasileira merece em retribuição e gratidão por mais de um século de história em terras brasileiras. Somos brasileiros e exigimos respeito para com todos, independentemente de sua ascendência. A diversidade étnica, social
e/ou de gênero é fundamental e necessária para o crescimento de qualquer cidadão.

Entendemos que, frente às desigualdades existentes, não basta rejeitar as práticas de discriminação, mas sim realizar ações que possam corrigir distorções e aproximar indivíduos. É responsabilidade de cada um de nós brasileiros, promover a igualdade no cotidiano, através de nossos atos, trabalhos e postura. É de extrema importância que os profissionais que atuam diretamente na concepção e produção de obras de audiovisual, tenham a consciência de que a sua criação pode influenciar positivamente a nossa sociedade e difundir a diversidade. Cabe também a nós, artistas orientais brasileiros, fomentar a imagem positiva de nossa comunidade, através de nosso trabalho artístico, para que as futuras gerações possam se olhar com a autoestima de um cidadão brasileiro pertencente a esta nação.

A partir de 01.09.16, O Coletivo Oriente-se divulgará, semanalmente, um vídeo inédito através do Canal do Youtube (www.youtube.com/coletivoorientese) retratando o oriental como cidadão brasileiro, com dilemas, humor, drama e interagindo com outras etnias, afim de promover a diversidade humana!
São Paulo, 31 de agosto de 2016.


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