A música é a bala que não mata:
Hei, São Paulo, terra de arranha-céu
A garoa rasga a carne, é a Torre de Babel
Família brasileira, dois contra o mundo
Mãe solteira de um promissor vagabundo
Luz, câmera e ação, gravando a cena vai
Um bastardo, mais um filho pardo, sem pai
•••
Esse não é mais seu, ó, subiu
Entrei pelo seu rádio, tomei, cê nem viu
Nóis é isso ou aquilo, o quê? Cê não dizia?
Seu filho quer ser preto, ah, que ironia.
Desembarcamos do carro e caminhamos ao lado do muro grafitado com os rostos dos quatro filhos do lugar – cultuados em cada casebre daquele naco de Brasil.
Uma moto com dois caras estacionou. Eles tiram os capacetes, olhos apertados e vermelhos. Nos olham de cima abaixo. E seguiram.
Entramos na Fundão Roupas, case obrigatório quando o assunto é grife de favela. "Eu vendo online pra vários países", disse a dona, moradora local. Mano Brown veste dentro e fora dos palcos. Os carros da região adotaram o adesivo com a marca laranja e verde como uma espécie de segunda placa.
A empresária contou que, nas quebradas de São Paulo, muitas vezes, a polícia rasga as roupas dos moleques quando vê o F de Fundão. "Eles acham que a gente tem ligação com o tráfico, mas, graças a Deus, a gente não tem", garantiu. Humanidade, pobreza e marginalidade formam um equilíbrio peculiar que pude perceber nos poucos minutos que transitei por ali. Talvez uma impressão errada, rápida demais, mas uma impressão.
Comprei uma camiseta polo. Era R$ 100, mas tinha desconto de R$40 "pros amigos do Manoel". Escolhi uma azul marinho, com uma estampa discreta. Poderia ser usada em qualquer campo de golfe do planeta. Talvez alguém ache que é deboche. Não é. Também é função da arte – música, moda e tudo mais – ser projeto e concreto dessas pontes improváveis. E quanto mais arriscado for cruzá-las, melhor.