O tal vídeo, como boa parte dos textos que pregam mudanças abruptas no estilo de vida, tem transformado a felicidade na mais cruel imposição contemporânea. Nem o culto à magreza ou à beleza é tão rasteiro. Porque a idolatria do corpo é contestada e combatida, tem suas futilidades denunciadas o tempo todo, mas a glorificação da felicidade carrega um falso viés de filantropia, como se fosse muito nobre exigir de todos algo tão elementar na existência humana.
O resultado dessa ode ao bem-estar é uma epidemia de insatisfeitos, principalmente no trabalho. Jovens que, após seis meses no primeiro emprego, vão morar na Irlanda porque estão "cansados". É incrível a quantidade de jovens cansados. Deprimem-se porque jamais serão felizes como os ativistas da alegria, que abarrotam a web com suas invejáveis guinadas no amor e na carreira, sempre acompanhadas de frases edificantes.
Uma dessas frases é atribuída a Confúcio: "Escolha um trabalho que ame e não precisará trabalhar um único dia na vida". Que bobagem. Eu e o Carlos André Moreira, editor do caderno DOC, esses tempos ficamos imaginando o jovem Confúcio, 500 anos antes de Cristo, época em que poucos podiam escolher o próprio trabalho – em geral, aprendia-se na família uma atividade para sobreviver –, refletindo angustiado na vastidão dos campos chineses:
– Cansei de ser pastor de ovelhas. Com a expansão militar do Império, acho que a onda agora é ser ferreiro!
Ora, por favor.
É corajoso e irável alguém mudar de vida não para fugir das frustrações, mas para enfrentá-las. Alguém mudar de vida reconhecendo que, seja como vendedor vegano em Itacaré ou como garçom nas Bahamas, novas frustrações serão sempre inevitáveis – e sempre pedagógicas, enriquecedoras, necessárias. Porque ideal o mundo nunca vai ser. No mundo possível, felicidade é algo que se constrói. E construí-la dá trabalho.